segunda-feira, 26 de maio de 2014

A poeta

Minha primeira tentativa de ser poeta veio aos 7 anos de idade. À essa altura, o que me faltava de estatura, me sobrava de magreza, e eu nem sabia o que era vida ainda, mas danada como era, desatinei a escrever. 
Aos 10 anos, depois de algumas tentativas, eis que sai o poema: 
"Chorei sangue pelas veias e artérias  de meu coração" 
Eu era cálida. 
Aos 10 anos já gostava de Anatomia, e sabia quase que instintivamente que chorar pelas veias primeiro era mais grave por durar mais tempo, coisa que eu só descobriria anos depois...
Fui então por várias vezes alvo certo na roda de amigos, sequela da  minha primeira tentativa frustrada de ser escritora, frutos que colho até hoje, através de risadas, quando lembramos deste tempo. O que me traz felicidade e a certeza de que possuo o honra de ter velhos amigos. 
A verdade é que amigos traumatizam mas sempre falam a verdade, nua e cria, as vezes cozida, as vezes torta, mas sempre verdade. 
E o que eles me diziam na época era apenas que eu não podia assim ser uma criança "normal".
Demorei algum tempo para vencer
esse trauma. Até pouco, não mostrava muitos textos. Poesia então, desisti. Deixei para os  cadernos guardarem dentro de si aquilo poético que eu achava que tinha. Poesia é bom, pois é bem democrática. Sempre vai ter algum ser ou alguma categoria que te encaixe bem.
O fato é que revirando os cadernos, li relatos de mim, aos 7 anos de idade, com uma nota dez da professora depois de reinventar um poema do Fernando Pessoa. Isso foi antes das "artérias", incrível como se pode perder a auto-estima com fatos bobos de outros tolos do cotidiano. A alma pré adolescente é sempre fraca. 
A professora, grande mestra, que lembro bem até hoje, sempre gostou de mim, mesmo temperamental, mesmo cálida, mesmo tagarela de auto-estima baixa. Era daquelas pessoas que tinham a visão de águia. 
Ela entendia que escrever para mim nada mais era que um instinto, uma sobrevivência da alma. Quase uma necessidade. 
Necessidade para mim. Não para os outros. Sempre achei muita petulância escritores quererem determinar as verdades do
Mundo. Os leitores aceitam aquilo que lhe convém! 
Necessidade sim. Como o impero que surge nas horas mais inapropriadas possíveis da rotina. 
Mova esses dedos antes da ideia passar!
Mexendo na caixa, levantei a poeira de anos de escrituras e leituras guardados e escondidos. O coração sentiu, na hora, em meio a poemas, diários e cartas, muitas cartas que sempre gostei de escrever para as amigas das fileiras distantes na classe. 
E depois de tantos anos, agradeço professora, por recuperar o fôlego e retirar a poeira do poema.
Escreverei assim, leve e solta, aquilo que me couber, aquilo que já não couber mais em mim.
Deixe meus amigos terem o que falar nas rodas. Eu preciso mesmo encontrá-los com mais frequência. Estou devendo anos de risadas.
Escreverei, deixando assim a minha alma respirar o que precisa.
Sem medo de ser infeliz.